Pessoas que não transpiram sofrem com altas temperaturas do verão

Pacientes com displasia ectodérmica não têm glândulas sudoríparas.

 Diante das altas temperaturas observadas neste verão, existe um grupo em especial que é afetado de forma ainda mais intensa do que o resto da população. São as pessoas com displasia ectodérmica anidrótica, uma doença genética que tem como sintoma a ausência das glândulas sudoríparas. Quem tem a síndrome não transpira e, justamente por isso, tem a sensação de calor muito acentuada.

O garoto Kauã Soares Oliveira, de 7 anos, que mora no Parque Residencial Cocaia, na Zona Sul de São Paulo, recebeu o diagnóstico aos 3 anos. Desde então, sua mãe, Patrícia Soares de Oliveira, preocupa-se em garantir que a casa esteja sempre arejada e que o filho só vista roupas leves e frescas.

Já Caio Medeiros, de 6 anos, teve o diagnóstico logo nas duas primeiras semanas de vida. Sua mãe, Elanne Medeiros, visitou quatro dos maiores hospitais de Recife, onde vive a família, antes de receber um encaminhamento para um geneticista, que detectou a doença.

Caso um paciente com essa síndrome se exponha ao sol por muito tempo, pode desenvolver um quadro de hipertermia, com sintomas como câimbra, ânsia de vômito, fraqueza e até convulsões. "O suor é a forma que o organismo tem para liberar calor e regular a temperatura. Como essas pessoas não produzem suor, são intolerantes ao calor", diz a dermatologista Carolina Marçon, que faz parte da Sociedade Brasileira de Dermatologia.
Para Kauã, o banho quente é proibido: o garoto só pode tomar banho morno ou frio, mesmo no inverno. Até os horários na escola tiveram que ser adaptados. Depois de explicar o problema para a professora, a turma de Kauã passou a fazer aula de educação física no último horário da tarde, quando o sol já está mais suave, para evitar o calor excessivo. Em casa, a solução é manter a janela aberta, já que o garoto não pode ser exposto a ventiladores porque, além da displasia, ele também sofre de bronquite.
"Nessa época é mais difícil, ele sofre muito mais com o calor", diz Patrícia. A falta de suor também faz com que ele tenha uma pele muito seca, provocando coceiras no corpo todo, inclusive na cabeça.
Os cabelos são finos e ralos e os dentes também têm características específicas –além de ele ter menos dentes, os que nasceram são pontudos e espaçados– por causa da doença. Por isso, o garoto já faz tratamento médio e, aos 16 anos, terá de se submeter a implantes dentários.
Desmaio
Já o garoto Caio chegou a desmaiar na escola por causa da temperatura elevada, há dois anos. "Agora, ele está aprendendo a lidar com isso e, quando sente muito calor, corre para uma pia e coloca a cabeça embaixo da torneira. Ou procura um ar-condicionado", conta a mãe, Elanne.
Para aguentar as altas temperaturas do verão de Recife, Caio conta com um ar-condicionado em casa e recorre a diversos banhos por dia. "Quando ele sai da escola, às 14h30, quer ficar na frente do ar-condicionado no carro. E, no verão de Recife, não tem ar-condicionado que dê conta", diz. Ela relata que, quando pega trânsito e o trajeto é mais demorado, o garoto tem que se molhar com uma garrafinha de água para se refrescar.
Segundo a dermatologista Carolina, os sintomas da doença geralmente começam a ficar mais perceptíveis aos dois anos de idade, quando a criança passa a ter febres de origem indeterminada. "Não tem uma medicação para tratar. É preciso controlar e fazer com que a criança se adapte à condição", diz.
Os cuidados fundamentais são ingerir muito líquido, hidratar a pele e evitar sair de casa em climas muito quentes. "Os pais têm que ser muito orientados, a criança deve ser mantida em ambientes com ar-condicionado ou bem ventilados, a pele tem que ser bem hidratada para evitar lesões e podem ser necessários lubrificantes oculares", diz. O acompanhamento odontológico também é importante, segundo a especialista.
A doença afeta uma em cada 1 milhão de pessoas e as formas típicas atingem principalmente os homens. "Quem transmite a doença é a mulher, mas quem desenvolve são os homens", diz a dermatologista.
Elanne relata que mantém contato com uma organização dos Estados Unidos –a Fundação Nacional para Displasias Ectodermais– que fornece materiais educativos e informações atualizadas sobre a doença. Para ela, seria importante que a população e a classe médica conhecessem mais sobre o assunto, pois o diagnóstico costuma demorar muito. "Queria que as pessoas não sofressem tanto quanto eu sofri no início. Cheguei a levar o Caio a mais de 25 médicos particulares e muitos nem conheciam a doença."
G1.

Comentários