Fux volta atrás em decisão e cancela registro de Marcelo com base na lei das inelegibilidades

Roberta Tum (Blog)
Mudou: Fux impede posse de senador "eleito" que tinha escapado da Ficha LimpaMinistro Luiz Fux (web)
O ministro Luiz Fux reformou decisão prolatada, no dia 5 de maio, em que favorecia o senador eleito Marcelo Miranda(PMDB), com a confirmação do seu registro. Na página do STF de hoje, terça-feira, 18/05, o ministro afirma fazer correções na decisão ainda não publicada. Ele confirmou a cassação do registro de Marcelo Miranda com base na LC 64/90, considerando sua inelegibilidade válida pelo período de 3 anos após a cassação.
O senador eleito Marcelo Miranda (PMDB) teve o registro de sua candidatura definitivamente cassado por decisão monocrática reformada do ministro Luiz Fux, datada de 12 de maio e publicada nesta terça-feira, 18, na página do STF.

Fux reformou a decisão antes da publicação considerando que Marcelo Miranda estava inelegível por três anos na data do registro de sua candidatura, tomando por base para aplicação da inelegibilidade a data da cassação, em 2009.

Com a decisão, o senador empossado, Vicente Alves(PR), o Vicentinho, está definitivamente confirmado no cargo.
Fux reformou decisão do TSE apenas na aplicação do Ficha Limpa
O recurso impetrado pelo senador eleito, Marcelo Miranda(PMDB) questionando a aplicação da lei da Ficha Limpa para o cancelamento do seu registro de candidatura foi acatado parcialmente pelo ministro Fux, no novo texto que reforma e complementa decisão anterior. ao afastar a aplicabilidade da lei, o ministro explica: "Mas a verdade é que a conclusão pela inelegibilidade, in casu, decorre não só da aplicação da Lei da Ficha Limpa, mas também da redação anterior do citado dispositivo legal, como frisou o acórdão recorrido (fls. 1054, 1057, 1060 e 1073) e como restou explicitado na decisão que admitiu o recurso extraordinário (fls. 1431), com a única ressalva de que, de acordo com o texto original da LC nº 64/90, tal prazo deveria se limitar a três anos. Ex positis, com fundamento no artigo 557, § 1º-A, do CPC, conheço e dou provimento monocrático ao recurso extraordinário, reformando a decisão do Tribunal Superior Eleitoral no Recurso Ordinário nº 602-83.2010.6.27.0000 exclusivamente para afastar a aplicação às eleições de 2010 das disposições introduzidas na LC nº 64/90 pela Lei da Ficha Limpa (LC nº 135/10)."

Leia a íntegra da decisão do ministro Luiz Fux abaixo:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 636.878 (993)

ORIGEM :PROC - 6028320106270000 - TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL

PROCED. : TOCANTINS

RELATOR :MIN. LUIZ FUX

RECTE.(S) :MARCELO DE CARVALHO MIRANDA

ADV.(A/S) : FERNANDO NEVES DA SILVA

RECDO.(A/S) :MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL

PROC.(A/S)(ES) :PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. DIREITO ELEITORAL. REGISTRO DE CANDIDATURA. INELEGIBILIDADE. ELEIÇÕES DO ANO DE 2010. APLICAÇÃO IMEDIATA DA LEI COMPLEMENTAR Nº 135/2010 (LEI DA FICHA LIMPA). INEXISTÊNCIA DE INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL. TEMA COM REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA PELO PLENÁRIO. REGRA DA ANTERIORIDADE ELEITORAL (CF, ART. 16). INAPLICABILIDADE DA LEI COMPLEMENTAR Nº 135/2010 ÀS ELEIÇÕES GERAIS OCORRIDAS EM 2010. PROTEÇÃO DA CONFIANÇA LEGÍTIMA. SEGURANÇA E ESTABILIDADE DAS REGRAS QUE INFORMAM O PROCESSO ELEITORAL. PRECEDENTE FIRMADO NO JULGAMENTO DO RE Nº 633.703, SESSÃO PLENÁRIA DE 23.03.2011. AUTORIZAÇÃO PARA APLICAÇÃO MONOCRÁTICA DA TESE. INAPLICABILIDADE DO NOVÉL PRAZO. INCIDÊNCIA DA REDAÇÃO ORIGINAL DA LC Nº 64/90. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE QUE AMPARAM PRETENSÃO DE MERO REEXAME DE INTERPRETAÇÃO DE ÍNDOLE EXCLUSIVAMENTE INFRACONSTITUCIONAL. DESCABIMENTO DE ALEGAÇÃO DE BIS IN IDEM, PORQUANTO A INELEGIBILIDADE NÃO CONFIGURA PENA. ALEGAÇÃO DE VARIAÇÃO NA JURISPRUDÊNCIA DO TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL QUANTO À INTERPRETAÇÃO DA ALÍNEA 'H' DO INC. I DO ART. 1º DA LC Nº 64/90. INEXISTÊNCIA DE OFENSA À SEGURANÇA JURÍDICA E À ISONOMIA, DADA A FRAGILIDADE DA BASE DA CONFIANÇA. IMPROCEDÊNCIA DA ALEGAÇÃO DE EQUIPARAÇÃO INDEVIDA ENTRE AGENTES POLÍTICOS E AGENTES TITULARES DE CARGOS ADMINISTRATIVOS. POSSIBILIDADE DE EQUIPARAÇÃO FINALÍSTICA POR VALORAÇÃO DO LEGISLADOR. INEXISTÊNCIA DE OFENSA À COISA JULGADA MATERIAL. INELEGIBILIDADE COMO CONSEQUÊNCIA DE PLENO DIREITO DO TRÂNSITO EM JULGADO. MANUTENÇÃO DO INFERIMENTO DA CANDIDATURA DO RÉU. REFORMA DO ACÓRDÃO RECORRIDO APENAS PARA AFASTAR A APLICABILIDADE DAS DISPOSIÇÕES DA LC Nº 135/10 ÀS ELEIÇÕES DE 2010.

1. Recurso extraordinário interposto contra acórdão, proferido pelo TSE, que, julgando em grau de recurso ordinário ação de impugnação de mandato eletivo, indeferiu a candidatura do recorrente ao cargo de Senador da República, pelo Estado de Tocantins, nas eleições de 2010, dada a configuração de hipótese de inelegibilidade prevista na alínea 'h' do inc. I do art. 1º da LC nº 64/90, tanto em sua interpretação original quanto na posterior à entrada em vigor da LC nº 135/10.

2. Improcedência do argumento de inconstitucionalidade formal da Lei da Ficha Limpa, porquanto apenas redacional a alteração operada no Senado Federal, conforme decidido no RE nº 630.147/DF (Informativo STF nº 601).

3. As disposições da Lei da Ficha Limpa não são aplicáveis às eleições realizadas no ano de 2010, por força da incidência do art. 16 da Constituição Federal e dos princípios constitucionais da segurança jurídica e da proteção da confiança legítima, que asseguram a estabilidade nas regras do processo eleitoral (RE n. 633.703, Relator o Ministro Gilmar Mendes, sessão Plenária de 23.6.2011).

4. Conclusão pelo indeferimento da candidatura do réu para o pleito de 2010 que, apesar disso, mantém-se hígida, dada a incidência do texto original da alínea 'h' do inc. I do art. 1º da LC nº 64/90, como afirmado pelo acórdão recorrido interpretando a legislação infraconstitucional à luz dos fatos subjacentes à causa.

5. A definição do sentido e do alcance das normas infraconstitucionais escapa da alçada do Supremo Tribunal Federal, nos termos do art. 102, caput e inc. III, da Constituição Federal, que não poderia ter sua competência constitucional elastecida sempre que arguida a irrazoabilidade ou a desproporcionalidade de determinada interpretação de dispositivo legal.

6. Improcedência da alegação de ofensa à vedação ao bis in idem, de vez que as inelegibilidades não configuram sanções, não se podendo aplicar à hipótese um princípio de índole essencialmente penal, voltado para a contenção do poder punitivo do Estado. Precedente.

7. Sob pena de transformar esta Corte Suprema em instância de uniformização da interpretação de normas infraconstitucionais levada a cabo por todos os tribunais nacionais, a variação de jurisprudência só pode render cabimento ao recurso extraordinário, com fundamento na segurança jurídica e na igualdade, quando operada em afronta a uma base robusta já cristalizada de confiança legítima dos jurisdicionados, o que não ocorre in casu.

8. A possibilidade de se extrair, dos arts. 37, 38 e 39 do texto constitucional, a distinção entre agentes públicos titulares de mandato eletivos e agentes exercentes de cargos administrativos não impõe, de modo inafastável, a vedação a que a lei equipare tais figuras para determinados fins, como se passa com a tutela do equilíbrio do processo eleitoral face ao abuso do poder político e econômico.

9. A inelegibilidade prevista na alínea 'h' do inc. I do art. 1º da LC nº 64/90 não ofende a coisa julgada material, mas, muito pelo contrário, tem-na, segundo a redação original, como um verdadeiro pressuposto para sua configuração, que opera de pleno direito, distinguindo-se dos efeitos proclamados na sentença condenatória.

10. Inelegibilidade que, no caso concreto, decorre não apenas da aplicação da Lei da Ficha Limpa, mas também da redação anterior do citado dispositivo legal, como frisado pelo acórdão recorrido, com a única ressalva de que, de acordo com o texto original da LC nº 64/90, o referido prazo deveria se limitar a três anos.

11. Recurso extraordinário provido exclusivamente para afastar a aplicação às eleições de 2010 das disposições introduzidas na LC nº 64/90 pela Lei da Ficha Limpa (LC nº 135/10), mantendo-se o indeferimento do registro de candidatura do réu.

DECISÃO: Trata-se de recurso extraordinário interposto com fundamento nos arts. 102, III, "a", e 121, § 3º, da Constituição Federal e no artigo 281 do Código Eleitoral, contra acórdão proferido pelo Tribunal Superior Eleitoral no recurso ordinário nº 602-83.20106.27.0000, cuja ementa restou lavrada nos seguintes termos (fls. 1037/1038):

"REGISTRO DE CANDIDATURA. ELEIÇÕES 2010. SENADOR. LEGITIMIDADE RECURSAL. MÉRITO. APLICAÇÃO IMEDIATA DA LEI COMPLEMENTAR Nº 135/2010. CAUSA DE INELEGIBILIDADE. ART. 1º, I, d E h, DA LEI COMPLEMENTAR Nº 64/90. CONFIGURAÇÃO.

1. Partido integrante de coligação não possui legitimidade para atuar isoladamente no processo eleitoral, nos termos do art. 6º, § 4º, da Lei nº 9.504/97.2 . Não possui legitimidade para recorrer da decisão que deferiu o pedido de registro de candidatura a coligação que não o impugnou. Incide, pois, à espécie, o disposto na Súmula nº 11 do c. TSE: 'No processo de registro de candidatos, o partido que não o impugnou não tem legitimidade para recorrer da sentença que o deferiu, salvo se se cuidar de matéria constitucional'.

3. Recurso interposto pelo Partido da Social Democracia Brasileira - PSDB e pela Coligação Tocantins Levado a Sério não conhecido. 4. A coligação que não impugnou o pedido de registro de candidatura não pode ingressar no feito na qualidade de assistente, em razão do disposto na Súmula nº 11/TSE. Precedentes.

5. Recurso interposto pela Coligações Nova União do Tocantins e Frente Tocantins Levado a Sério não conhecido.

6. A Lei Complementar nº 135/2010, que alterou a Lei Complementar nº 64/90, tem aplicação imediata aos pedidos de registro de candidatura das Eleições 2010, segundo entendimento firmado por esta c. Corte.

7. A alínea d do art. 1º, I, da LC nº 64/90 refere-se apenas às "representações" julgadas procedentes pela Justiça Eleitoral, não incluindo, portanto, o recurso contra expedição de diploma.

8. O art. 1º, I, h, da LC nº64/90 refere-se a todos os detentores de cargo na Administração Pública, abrangendo, assim, os agentes públicos ocupantes de cargo eletivo.

9. Considerando que o candidato recorrido Marcelo de Carvalho Miranda foi condenado definitivamente, por decisão unânime do c. TSE, em 12.8.2009, pela prática de abuso de poder público durante o exercício de mandato eletivo, incidem na espécie as causas de inelegibilidade previstas no art. 1º, I, alíneas d e h da LC nº 64/90 com redação dada pela LC nº 135/2010, pelo prazo de 8 (oito) anos a contar da eleição na qual ele foi diplomado.

10. Recurso ordinário interposto pelo Ministério Público Eleitoral provido para indeferir o registro de candidatura do recorrido ao pleito de 2010.

Posteriormente, a oposição de embargos de declaração, parcialmente acolhidos, ensejou a prolação de novo acórdão, cuja ementa é a seguinte (fls. 1096/1097):

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. RECURSO ORDINÁRIO. REGISTRO DE CANDIDATURA. SENADOR. ELEIÇÕES 2010. OMISSÃO OU OBSCURIDADE. AUSÊNCIA. CONTRADIÇÃO. EQUÍVOCO MATERIAL. RETIFICAÇÃO.

1. A omissão que desafia os declaratórios é aquela referente às questões, de fato ou de direito, trazidas à apreciação do magistrado, e não a referente às teses defendidas pela parte, as quais podem ser rechaçadas implícita ou explicitamente. Precedentes.

2. Não há falar em omissão de matéria que sequer foi arguida nas razões recursais.

3. As supostas omissões apontadas pelo embargante denotam o mero inconformismo com os fundamentos adotados pelo v. acórdão embargado e o propósito de rediscutir matéria já decidida, providência inviável na via aclaratória, conforme jurisprudência pacífica desta c. Corte Superior.

4. Houve, de fato, contradição entre o item nº 9 da ementa do acórdão recorrido e o voto, por ter constado equivocadamente a menção à alínea "d" do art. 1º, I, da LC nº 64/90.

5. Embargos de declaração acolhidos parcialmente, tão somente para retificar o equívoco material apontado, excluindo do item nº 9 da ementa do acórdão embargado a referência à alínea "d" do art. 1º, I, da LC nº 64/90.

Na origem, a hipótese dos autos versa sobre ação de impugnação de mandato eletivo, ajuizada pelo Ministério Público eleitoral, decorrente da candidatura do recorrente ao cargo de Senador pelo Estado de Tocantins nas eleições de 2010. Como fundamentos, sustentou o autor da demanda que o réu estaria inelegível para o pleito daquele ano, porquanto condenado em 2009, por decisão transitada em julgado do TSE (RCED 698/TO), pela prática de abuso de poder político e econômico nas eleições de 2006 para o cargo de Governador de Estado, oportunidade em que disputara a reeleição.

Assim, e levando em conta que o réu restou afastado do cargo, à época, em 08/09/2009, estaria ele, segundo a inicial, inelegível para o pleito de 2010 por força da incidência da alínea 'h' do inc. I do art. 1º da LC nº 64/90, e isso tanto na redação original do dispositivo, que previa o prazo de 3 anos de inelegibilidade, que se exauriria apenas em 08/09/2012, como na redação posterior à entrada em vigor da LC nº 135/10, que estendeu o prazo de inelegibilidade para oito anos. A sucessão de redações do dispositivo é a seguinte:

Art. 1º São inelegíveis:

I - para qualquer cargo:

h) os detentores de cargo na administração pública direta, indireta ou fundacional, que beneficiarem a si ou a terceiros, pelo abuso do poder econômico ou político apurado em processo, com sentença transitada em julgado, para as eleições que se realizarem nos 3 (três) anos seguintes ao término do seu mandato ou do período de sua permanência no cargo;

(redação original)

h) os detentores de cargo na administração pública direta, indireta ou fundacional, que beneficiarem a si ou a terceiros, pelo abuso do poder econômico ou político, que forem condenados em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão judicial colegiado, para a eleição na qual concorrem ou tenham sido diplomados, bem como para as que se realizarem nos 8 (oito) anos seguintes; (Redação dada pela Lei Complementar nº 135, de 2010)

Em sua defesa (fls. 584 e segs.), sustentou o réu, em primeiro lugar, a impossibilidade de incidência da Lei Complementar nº 135/10 às eleições de 2010, por força do art. 16 da Constituição Federal. Argumentou, ainda, que a referida lei violaria o princípio constitucional da presunção de inocência, porquanto dispensado o trânsito em julgado para desencadear a inelegibilidade. Asseverou também que a nova lei não poderia estender o prazo de inelegibilidade decorrente de condenações já transitadas em julgado, sob pena de ofensa ao art. 5º, XXXVI, da Constituição. De outro lado, o réu sustentou que a alínea 'h' da LC nº 64/90, em suas sucessivas redações, não seria aplicável ao caso, porquanto não incidente no que pertine aos titulares de mandato eletivos, mas apenas aos demais exercentes de cargos e funções na Administração Pública.

A decisão proferida pelo TRE de Tocantins (fls. 698 e segs.) julgou improcedente a impugnação, deferindo o pedido de candidatura do réu. Como fundamento, entendeu-se que a Lei da Ficha Limpa não poderia incidir nas eleições de 2010, diante do art. 16 da CF, destacando-se, ainda, que a irretroatividade das leis impedira a ampliação de sanções já aplicadas no passado. Na sequência, foi afastada a incidência da alínea 'h' do inc. I do art. 1º da LC nº 64/90 para detentores de mandato eletivo, que, na realidade, sujeitar-se-iam apenas à alínea 'd' do diploma, cuja redação anterior dispunha que "os que tenham contra sua pessoa representação julgada procedente pela Justiça Eleitoral, transitada em julgado, em processo de apuração de abuso do poder econômico ou político, para a eleição na qual concorrem ou tenham sido diplomados, bem como para as que se realizarem 3 (três) anos seguintes", de modo que os três anos após a eleição de 2006 já haviam transcorrido em 2009, antes das eleições de 2010, portanto.

Ao analisar a causa em sede de recurso ordinário, o Tribunal Superior Eleitoral proferiu o acórdão ora recorrido, integrado, posteriormente, pelo julgamento de embargos de declaração, na forma das ementas transcritas acima, no qual foi dado provimento ao recurso do Ministério Público para o fim de indeferir o registro de candidatura do réu. A maioria vencedora daquela Corte, com a ressalva dos votos vencidos dos Ministros Marco Aurélio e

Marcelo Ribeiro, entendeu que incidiria, no caso dos autos, as novas disposições da Lei da Ficha Limpa, dada a jurisprudência reiterada daquele Tribunal afastando a aplicação do art. 16 da CF. Deste modo, incidira, in casu, a hipótese de inelegibilidade estabelecida na alínea 'h' do art. 1º da Lei Complementar nº 64/90, na medida em que também abarca os agentes

detentores de mandato eletivo, razão pela qual o indeferimento da candidatura do réu seria mera consequência da inelegibilidade pelo prazo de oito anos a contar da eleição na qual fora diplomado.

De outro lado, a maioria vencedora asseverou que a inelegibilidade também decorreria da aplicação à hipótese do art. 1º, I, 'h', da LC nº 64/90 mesmo antes da entrada em vigor da Lei da Ficha Limpa, de vez que a alteração legislativa não teria inovado além da extensão do prazo. Frisou-se, ainda, que a alínea 'd' do dispositivo não incidiria por se tratar de hipótese restrita a condenações em ações de investigação judicial eleitoral (AIJE), sendo que o caso dos autos decorreu de ajuizamento de recurso contra expedição de diploma (RCED).

Após a oposição de embargos de declaração, o recorrente apresenta, nesta sede, recurso extraordinário, sustentando preliminarmente o preenchimento dos requisitos de admissibilidade e a existência de repercussão geral das matérias constitucionais. No mérito, aduz a inconstitucionalidade formal da LC 135/10, por conta de alteração operada no Senado Federal sem que disso tivesse decorrido o retorno do projeto à casa legislativa original (CF, art. 65, parágrafo único). Aponta, ainda, a impossibilidade de cumulação e de sobreposição das cláusulas de inelegibilidade contempladas na atual redação das alíneas "d" e "h" do art. 1º, I, da LC 64/90, o que ofenderia os princípios constitucionais da proporcionalidade, da razoabilidade e da vedação ao bis in idem. Assevera também que o TSE teria violado os princípios constitucionais da segurança jurídica e da isonomia, dada a alteração da jurisprudência tradicional que afastava a incidência da alínea 'h' do inc. I do art. 1º diante de condenações prolatadas pela Justiça Eleitoral, que, assim, só se subsumiriam à alínea 'd' do referido dispositivo. Sustenta, ademais, que a distinção entre titulares de mandato eletivo e agentes exercentes de cargos públicos seria de índole constitucional, de modo que a identidade de regime, acolhida no acórdão recorrido, importaria violação aos arts. 37, 38 e 39 da Constituição Federal.

Na sequência, afirma ter se configurado violação à garantia da coisa julgada material, porquanto a decisão proferida no RCED 698/TO, em 2009, não lhe teria cominado a inelegibilidade, mas apenas a cassação de seu diploma. Por fim, alega que as disposições da Lei da Ficha Limpa não poderiam incidir nas eleições de 2010 por força do disposto no art. 16 da Constituição Federal.

Após admitido o recurso na instância de origem (fls. 1428-32), às fls. 1438 e seguintes foi formulado pedido de intervenção como assistente simples por Vicente Alves de Oliveira em coadjuvação ao Ministério Público Federal, na qualidade de diplomado na vaga de Senador em decorrência do indeferimento da candidatura do réu. Às fls. 1451 foi requerido ingresso como litisconsorte, também em prol do Ministério Público Federal, por João Costa Ribeiro Filho, empossado no cargo de 1º Suplente de Senador da República.

Na sequência, às fls. 1464 foi requerido, pelo Partido da República, de que é membro o também peticionante Vicente Alves de Oliveira, seu ingresso como assistente igualmente do Ministério Público Federal, argumentando que a reversão do julgado seria capaz de reduzir sua representatividade no Senado.

É o relatório. Decido.

Preliminarmente, defiro os pedidos de intervenção no processo formulados às fls. 1438 e segs., 1451 e segs. e 1464 e seguintes, todos na qualidade de assistentes simples do Ministério Público Federal, porquanto titulares de relações jurídicas dependentes da sorte dos direitos subjetivos em jogo na presente demanda, que receberão, assim, o o processo no estado em que se encontra (CPC, art. 50, parágrafo único). Ressalto, contudo, o descabimento do pleito de ingresso como litisconsorte (fls. 1451 e segs.), porquanto, a rigor, a relação jurídica deduzida em juízo não é a mesma de que se afirma titular o interveniente: ao contrário, a relação do interveniente, empossado como primeiro suplente, mostra-se dependente da sorte do pedido formulado nos presentes autos, razão pela qual admito a intervenção sob as regras da assistência simples.

No mérito, porém, o acórdão recorrido merece ser objeto de reforma apenas pontual. Com efeito, não prospera, em primeiro lugar, o argumento de que a cognominada Lei da Ficha Limpa padeceria de inconstitucionalidade formal. É que a referida tese restou expressamente rejeitada pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, de vez que considerada apenas redacional a alteração operada no Senado Federal, conforme decidido no RE nº 630.147/DF, cujo julgamento restou noticiado no Informativo STF nº 601, de 29 de setembro de 2010, porquanto não publicado até o momento o respectivo acórdão.

A verdade, em todo caso, é que a Lei da Ficha Limpa não pode ser tida como aplicável à hipótese. O Supremo Tribunal Federal, na Sessão Plenária de 23.6.2011, no julgamento do RE n. 633.703, Relator o Ministro Gilmar Mendes, por unanimidade, reconheceu a repercussão geral da questão relativa à aplicação da Lei Complementar nº 135/2010 às eleições de 2010, em face da regra da anterioridade eleitoral (art. 16 da Constituição Federal) e, por maioria, deu provimento ao recurso extraordinário, fixando a não aplicação

da LC nº 135/2010 ao pleito do ano em que iniciada sua vigência. Por oportuno, transcrevo a ementa do voto que proferi naquela oportunidade, verbis:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. DIREITO ELEITORAL. INELEGIBILIDADE DECORRENTE DA LEI COMPLEMENTAR Nº 135/10. INDEFERIMENTO DE REGISTRO DE CANDIDATURA A DEPUTADO ESTADUAL. CONDENAÇÃO JUDICIAL, POR ÓRGÃO COLEGIADO, PELA PRÁTICA DE ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA (ART. 1º, I, 'l', DA LEI COMPLEMENTAR Nº 64/90, NA REDAÇÃO QUE LHE CONFERIU A LEI COMPLEMENTAR Nº 135/10). PRINCÍPIO DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA. LIMITES TEMPORAIS DA APLICAÇÃO DA COGNOMINADA "LEI DA FICHA LIMPA". ART. 16 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. REGRA DA ANTERIORIDADE ELEITORAL. ALTERAÇÃO DO PROCESSO ELEITORAL. STATUS DE CLÁUSULA PÉTREA. DEVIDO PROCESSO LEGAL ELEITORAL. PRESERVAÇÃO DA IGUALDADE DE CHANCES NAS ELEIÇÕES. MÉTODO DE INTERPRETAÇÃO E DE APLICAÇÃO DAS REGRAS E DOS PRINCÍPIOS JURÍDICOS. POSTULADOS DA UNIDADE E DA CONCORDÂNIA PRÁTICA DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS. SEGURANÇA JURÍDICA. PRINCÍPIO DA PROTEÇÃO DA CONFIANÇA. COMPORTAMENTO ESTATAL QUE ENSEJA A FRUSTRAÇÃO DAS EXPECTATIVAS LEGÍTIMAS DOS ENVOLVIDOS NO PLEITO ELEITORAL. IMPOSSIBILIDADE DE A LEI COMPLEMENTAR Nº 135/10 ATINGIR AS ELEIÇÕES OCORRIDAS NO ANO DE SUA ENTRADA EM VIGOR. NECESSÁRIA OBSERVÂNCIA DO ART. 16 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PROVIMENTO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO.

1. A "Lei da Ficha Limpa" representa um dos mais belos espetáculos democráticos experimentados após a Carta de 1988, porquanto lei de iniciativa popular com o escopo de purificação do mundo político, habitat dos representantes do povo, fundada nos princípios constitucionais da probidade e da moralidade administrativa (CF, art. 14, § 9º).

2. Os postulados da unidade e da concordância prática das normas constitucionais, que impõem a vedação a que o intérprete inutilize comandos normativos estabelecidos na Carta Constitucional de 1988, têm por consequência jus-filosófica que mesmo o melhor dos direitos não pode ser aplicado contra a Constituição.

3. A regra da anualidade eleitoral, fixada no art. 16 da Constituição Federal, determina que "a lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência".

4. O processo eleitoral, cuja estabilidade é assegurada pela regra da anualidade, compõem-se de três fases: fase pré-eleitoral, com as convenções partidárias e a definição do candidato; fase eleitoral, com o início, a realização e o encerramento da votação; e fase pós-eleitoral, com a apuração e contagem dos votos, seguida da diplomação dos candidatos (ADIn nº 3.345, Rel. Min. Celso de Mello).

5. A expressão processo eleitoral, utilizada no dispositivo, abarca normas de conteúdo procedimental e material, dada a finalidade de preservar o devido processo legal eleitoral, interditando a eficácia imediata de inovações legislativas abruptas, porquanto são justamente as regras de direito material no domínio eleitoral que mais podem influenciar a isonomia e a igualdade de chances nas eleições.

6. A restrição do âmbito de legitimados a concorrem no pleito, veiculada por normas de inelegibilidade, como fez a LC nº 135/10, configura inequívoca alteração no processo eleitoral, entendido como a série concatenada de atos dirigidos à definição dos mandatários políticos através do jogo democrático. Entendimento diverso conduziria ao paradoxo de consentir fosse dado aos titulares do poder a edição, em conflito com o princípio do pluralismo político (CF, art. 1º, V), de regras de exceção restritivas do ponto de vista subjetivo, interferindo na igualdade de chances de acesso aos cargos públicos.

7. Trata-se de recurso extraordinário em que questionada a aplicação da cognominada "Lei da Ficha Limpa" (LC nº 135/10) às eleições ocorridas no ano de 2010, mormente por conta da previsão, na nova redação do art. 1º, I, 'l', da LC nº 64/90, de novel hipótese de inelegibilidade, configurada diante de condenação, por órgão judicial colegiado, pela prática de ato de improbidade administrativa.

8. O sistema constitucional de inelegibilidade, quando da entrada em vigor da LC nº 135/10, já havia sido integralizado, há vinte anos, pela LC nº 64/90, descabendo falar, no caso sub judice, de risco de configuração de vácuo legislativo, porquanto a "Lei da Ficha Limpa", apesar de todos os seus inquestionáveis méritos, alterou - para usar a expressão literal do art. 16 da CF - o regime das inelegibilidades já em vigor no direito brasileiro.

9. Consequentemente, inexistentes, in casu, as mesmas razões de decidir que presidiram o julgamento do RE nº 129.392/DF, relator o Min. Sepúlveda Pertence, apreciado na sessão de 17/06/1992.

10. O art. 16 da Constituição Federal, como decorre da moderna teoria geral do direito e, mais particularmente, da novel teoria da interpretação constitucional, consubstancia uma regra jurídica, e não um princípio jurídico; constatação que impõe não seja possível simplesmente desconsiderar seu enunciado lingüístico para buscar desde logo as razões que lhe são subjacentes.

11. À Suprema Corte brasileira descabe simplesmente reescrever o art. 16 da Constituição Federal, no sentido de que, onde se lê "não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência", seja lido como marco temporal a data da realização das convenções partidárias, ou a data em que ocorrido o registro da candidatura, porquanto já tomada a decisão, pelo legislador constitucional, a respeito do marco inicial para a segurança jurídica no processo eleitoral, qual a inteireza do ano em que ocorrem as eleições.

12. A dinâmica eleitoral não se inicia apenas formalmente na convenção partidária: há movimentos políticos de estratégia que ocorrem antes, pela conjugação e harmonização de forças, como é notório, e notória non egent probationem, por isso que esse fato não pode ser simplesmente desconsiderado na identificação da razão subjacente ao art. 16.

13. Deveras, se há razões para condicionar à regra da anterioridade a eficácia de Emenda à Constituição publicada no mês de março - também antes, portanto, do período das convenções partidárias -, tal como decidido por este STF no julgamento da ADIn nº 3.685/DF, não há como entender diferente quanto à lei complementar publicada no mês de junho.

14. Os efeitos imediatos da Lei Complementar nº 135, de 04 de junho de 2010, infringem o princípio da proteção da confiança, difundido no Direito germânico e que, mais recentemente, ganha espaço no cenário jurídico brasileiro. Consectariamente, a ampliação das atividades estatais faz crescer uma exigência por parte dos cidadãos de maior constância e estabilidade das decisões que lhes afetam, de modo que um cidadão não consegue planejar sua vida se o Estado não atuar de forma estável e consistente. Mudança e

constância são, dessa forma, duas expressões que colidem no mundo pósmoderno.

15. O princípio da proteção da confiança, imanente ao nosso sistema constitucional, visa a proteger o indivíduo contra alterações súbitas e injustas em sua esfera patrimonial e de liberdade, e deve fazer irradiar um direito de reação contra um comportamento descontínuo e contraditório do Estado.

16. O art. 16 da Carta de 88 materializou o que a doutrina alemã denomina de disposições de transição; vale dizer: dispositivo constitucional que, ao deslocar, para um momento futuro, os efeitos de uma nova lei capaz de interferir no processo eleitoral, amortece os efeitos da nova norma, viabilizando a coesão social e a tutela da confiança que os indivíduos depositaram no Estado brasileiro.

17. A aplicação imediata da novel lei agride o princípio da proteção da confiança, dimensão subjetiva do princípio da segurança jurídica, tornando incerto o que certo, instável o que o texto constitucional buscou preservar. Como corolário do dispositivo, todo e qualquer candidato ou eleitor não esperavam ser afetados pelas mudanças encartadas na LC nº 135/10 em relação às eleições de 2010.

18. A Lei da Ficha Limpa é a lei do futuro, é a aspiração legítima da nação brasileira, mas não pode ser um desejo saciado no presente, em homenagem à Constituição Brasileira, que garante a liberdade para respirarmos o ar que respiramos, que protege a nossa família desde o berçodos nosso filhos até o túmulo dos nossos antepassados.

19. Recurso extraordinário provido.

Assim, é à luz da redação anterior da Lei Complementar nº 64/90, portanto, que o caso tem de ser resolvido. E, frise-se bem, mesmo assim se mantém hígida a conclusão pelo indeferimento da candidatura do réu para o pleito de 2010, em função da incidência do texto original da alínea 'h' do inc. I do art. 1º da LC nº 64/90, como consta do acórdão recorrido e mormente diante da insubsistência dos demais argumentos suscitados no recurso extraordinário.

Com efeito, a alegação de inconstitucionalidade por violação à proporcionalidade, à razoabilidade e à vedação ao bis in idem, por conta da suposta sobreposição das alíneas 'd' e 'h' do inc. I do art. 1º da LC nº 64/90, não rende ensejo à abertura da via estreita do recurso extraordinário. A definição do sentido e do alcance das normas infraconstitucionais escapa da alçada do Supremo Tribunal Federal, nos termos do art. 102, caput e inc. III, da Constituição Federal, que não poderia ter sua competência constitucional elastecida sempre que arguida a irrazoabilidade ou a desproporcionalidade de determinada interpretação de dispositivo legal, quando mais a incoerência em que, in casu, alega-se ter incorrido o TSE ao prolatar o acórdão recorrido.

Sequer é suficiente, no ponto, alegar ofensa à vedação, que é própria ao campo das sanções penais, à ocorrência de bis in idem. É que as inelegibilidades, conforme entendimento deste STF, não configuram sanções, de modo que não se pode aplicar à hipótese um princípio de índole essencialmente penal, voltado para a contenção do poder punitivo do Estado.

Nesse sentido foi a decisão prolatada no MS nº 22.087/DF, relatado pelo Min. Carlos Velloso, verbis:

CONSTITUCIONAL. ELEITORAL. INELEGIBILIDADE. CONTAS DO ADMINISTRADOR PÚBLICO: REJEIÇÃO. Lei Complementar n. 64, de 1990, art. 1., I, "g". I. - Inclusão em lista para remessa ao órgão da Justiça Eleitoral do nome do administrador público que teve suas contas rejeitadas pelo T.C.U., além de lhe ser aplicada a pena de multa. Inocorrencia de dupla punição, dado que a inclusão do nome do administrador público na lista não configura punição. II. - Inelegibilidade não constitui pena. Possibilidade, portanto, de aplicação da lei de inelegibilidade, Lei Compl. n. 64/90, a fatos ocorridos anteriormente a sua vigencia. III. - A Justiça Eleitoral compete formular juízo de valor a respeito das irregularidades apontadas pelo Tribunal de Contas, vale dizer, se as irregularidades configuram ou não inelegibilidade. IV. - Mandado de segurança indeferido. (MS 22087, Relator(a): Min. CARLOS VELLOSO, Tribunal Pleno, julgado em 28/03/1996, DJ 10-05-1996 PP-15132 EMENT VOL-01827-03 PP-00444)

Além disso, o acórdão recorrido conclui, de forma fundamentada, a alínea 'd' do referido dispositivo era de todo inaplicável à hipótese dos autos, o que torna descabida, ainda que por hipótese, a alegação de violação à vedação ao bis in idem.

Não houve, por outro lado, violação à segurança jurídica e ao princípio da isonomia. A variação de jurisprudência, natural à evolução da sociedade e da compreensão do direito, só pode render ensejo à competência recursal desta Corte, sob o fundamento de violação aos princípios constitucionais reputados infringidos pelo recorrente, quando manifestada de modo arbitrário, isto é, quando operada em afronta a uma base robusta já cristalizada de confiança legítima dos jurisdicionados. Entender de modo contrário levaria ao absurdo de transformar esta Suprema Corte em órgão de uniformização de jurisprudências particulares a cada um dos Tribunais nacionais, descendo à revisão de interpretações fundadas em normas de natureza exclusivamente infraconstitucional.

Ademais, como tornou claro o acórdão dos embargos de declaração (fls. 1103), proferido à unanimidade, o TSE "nunca fixou entendimento de que a alínea 'h' deveria incidir apenas nas condenações por abuso de poder proferidas na Justiça Comum. Ao contrário, como bem destacou em seu votovista o e. Ministro Arnaldo Versiani, a jurisprudência desta c. Corte jamais fez distinção quanto ao órgão prolator da condenação - se Justiça comum apenas, ou eleitoral - para a incidência da mencionada alínea 'h'. Transcrevo: (...)". E veja-se que mesmo o próprio acórdão embargado, às fls. 1071, já havia frisado que a interpretação que inclui no âmbito de incidência da referida alínea 'h' também as condenações proferidas pela Justiça eleitoral já fora proclamada no julgamento do RO nº 510, no ano de 2001.

Todas essas razões tornam frágil o argumento de quebra da uniformidade de tratamento, limitada, assim, ao âmbito infraconstitucional, e que, repita-se, não pode servir de amparo genérico para a abertura do acesso à competência recursal desta Corte.

Mostra-se igualmente de índole infraconstitucional a suposta ofensa aos arts. 37, 38 e 39 da Constituição Federal. O fato de ser possível extrair uma distinção constitucional entre os agentes públicos titulares de mandato eletivos e os agentes que exercem meros cargos administrativos não tem o condão de impor, por consequência necessária e inafastável, uma vedação a que a lei possa equiparar tais figuras para determinados fins. Ao contrário, a distinção de regime se configura apenas quando se mostrar presente uma razão suficiente para tanto, do ponto de vista teleológico. E foi justamente sob o ângulo finalístico que concluiu o acórdão recorrido, interpretando o disposto na alínea 'h' do inc. I do art. 1º da LC nº 64/90, para considerá-lo incidente também aos mandatos eletivos, frisando o Min. Relator que "o que importa, repito, é a proteção das eleições contra a influência indevida do poder político" (fls. 1053). Assim, o que pretende o recorrente é a revisão, por via transversa, da interpretação conferida à legislação infraconstitucional pelo TSE, o que éde todo incabível na presente sede.

E é manifestamente improcedente a alegação de violação à coisa julgada material. De fato, a inelegibilidade não é imposta, como pena, na condenação por abuso de poder nas eleições. Ao contrário, a inelegibilidade, que, in casu, já estava prevista na redação da Lei Complementar nº 64/90 à época dos fatos, é imposta de pleno direito como uma consequência da configuração das hipóteses previstas nas alíneas do inc. I do art. 1º da referida lei, como ocorre com as condenações criminais enunciadas no alínea 'e'. Assim, e segundo a redação então em voga, a inelegibilidade era uma decorrência da formação da coisa julgada material, e não um efeito proclamado na decisão sobre a qual esta última se formara.

Em suma, a única violação à Constituição constatada no acórdão recorrido consiste em considerar aplicável ao recorrente, ao indeferir o registro de sua candidatura ao pleito de 2010, o prazo de inelegibilidade de oito anos previsto na nova redação da alínea 'h' do inc. I do art. 1º da LC nº 64/90, segundo a nova redação que lhe conferiu a LC nº 135/2010, o que se encontra em desarmonia com o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal no leading case citado acima. Mas a verdade é que a conclusão pela inelegibilidade, in casu, decorre não só da aplicação da Lei da Ficha Limpa, mas também da redação anterior do citado dispositivo legal, como frisou o acórdão recorrido (fls. 1054, 1057, 1060 e 1073) e como restou explicitado na decisão que admitiu o recurso extraordinário (fls. 1431), com a única ressalva de que, de acordo com o texto original da LC nº 64/90, tal prazo deveria se limitar a três anos. Ex positis, com fundamento no artigo 557, § 1º-A, do CPC, conheço e dou provimento monocrático ao recurso extraordinário, reformando a decisão do Tribunal Superior Eleitoral no Recurso Ordinário nº 602-83.2010.6.27.0000 exclusivamente para afastar a aplicação às eleições de 2010 das disposições introduzidas na LC nº 64/90 pela Lei da Ficha Limpa (LC nº 135/10).

Publique-se a presente decisão na forma do art. 463 do CPC, porquanto a primeira decisão, a despeito de não ter sido publicada, continha omissão ora sanada.

Brasília, 12 de Maio de 2011.

Ministro LUIZ FUX

Relator

Documento assinado digitalmente

Comentários